TECENDO A VIDA
Assim
como se tece a rede, também tecemos a vida. Nesse processo,
fio a fio das entranhas da realidade, aprendemos a “com-viver” com
o diferente, o semelhante, enfim, com o outro.
Nessa caminhada
tive a oportunidade de conviver, através do trabalho, com
crianças e adolescentes e - por que não dizer também
com adultos - carentes, abandonados, subjugados, penalizados, oprimidos,
robotizados, inteligentes, criativos, afetivos, alegres.
Ora trabalhando
diretamente com os chamados “menores”, ora acompanhando os “maiores”
(educadores, monitores, trabalhadores sociais etc), refletia constantemente
sobre dois aspectos, que ainda hoje acompanham minha prática
clínica, apesar de eu não estar mais trabalhando com
essa população específica.
O primeiro refere-se
à compreensão do que se passa no mundo dessas pessoas
jovens, o que elas vêem e sentem, como concebem a vida. Como
vê-las, sentí-las estar junto e ao mesmo tempo não
se misturar ou confluir com elas? A meu ver, essa questão
não é da ordem do conhecimento, da formação
profissional, mas sim da ordem do humano, da capacidade de sentir
o outro e ainda assim continuar sendo quem se é, diz-se do
vocacionado, daquele que é capaz de se emocionar com a vida
“acon-tecendo”.
O segundo aspecto
trata-se do trabalho profissional em si. Para quem trabalhamos?
Com quem nos comprometemos? A que interesses atendemos? Somos fiéis
e cúmplices com a instituição “estado” ou com
o estado das pessoas que encontramos? Apesar do discurso institucional
não transparecer, como atender a interesses tão distintos?
Como conjugar ao mesmo tempo os verbos “ser” e “fazer”?
Perguntas que nos
desafiam sempre.
Março/2001
Rosane Correia e
Silva
Psicóloga, ex-coordenadora do Serviço de Atenção
ao Alcoolismo e à Drogadição/Coordenação
de Saúde Mental/ Ministério da Saúde |